Muito se falou desse ícone da música portuguesa que é Melão.
Muito, mas não o suficiente. Talvez pelo sentimento de intimidação que qualquer humilde mortal sente ao pronunciar o nome de Melão, talvez pelo simples facto que nada mais pode ser acrescentado a tão sublime espécime. Eu não sei, provavelmente o leitor também não saberá e creio que nem o próprio Melão faz ideia.
O que é certo é que a letra do single “Coração de Melão” é da melhor poesia contemporânea que o nosso solarengo país já viu.
Esta não é a primeira vez que discuto a poesia de Melão, mas sinto que nunca é demais apreciar e analisar o trabalho deste nosso tão conceituado artista. Atentemos então no refrão (e 78% da música) de “Coração de Melão”:
“Coração de melão
Melão, melão, melão
(ai) Coração de melão
Melão, melão. Melão”
Logo ao primeiro contacto apercebemo-nos que estamos na presença dum iluminado, a profunda metáfora entre melão e coração, a brilhante rima emparelhada entre melão/melão/melão/melão, o brilhante minimalismo em fazer uma quadra usando apenas 2 palavras, e o toque da interjeição “aí” a dar um pequeno lamiré à Álvaro de Campos.
Mas apesar de ser um poeta contemporâneo, Melão não descura os cânones clássicos. Reparem na contagem silábica: “Co-ra-ção de me-lão(6)/ me-lão me-lão me-lão (6)/ co-ra-ção de me-lão(6)/ me-lão me-lão (6)”.
Seis sílabas por verso, não cinco como na redondilha pequena, nem sete como na redondilha maior. E porquê? Porque se juntar mos o numero de sílabas de cada verso ficamos com o seguinte número: 6666. Ou seja 666(o número da besta)+6. Cá está o mais sublime de todos os pormenores de Melão. O Melão, que é uma besta, faz um poema onde se auto-invoca, aliás e não só se auto-invoca como ainda acrescenta mais um 6, porque Melão é uma besta, tudo bem, mas é mais que isto, Melão atinge o inatingível, Melão vai para lá da besta, Melão é uma besta extra uma autêntica Super Besta.
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